A Instrução Mahamudra de Tilopa para Naropa em Vinte e Oito Versos

A Instrução Mahamudra de Tilopa para Naropa em Vinte e Oito Versos
Homenagem aos Oitenta e Quatro Mahasiddhas!
Homenagem ao Mahamudra!
Homenagem à Vajradakini!

       [1] O Mahamudra não pode ser dito, mas ó inteligente Naropa,
       Como você passou pela austeridade rigorosa,
       Com tolerância no sofrimento e devoção ao mestre,
       Ó abençoado, guarde esta instrução secreta em seu coração.

       [2] O espaço é suportado em algum lugar? Sobre o que ele repousa?
       Como o espaço, o Mahamudra não depende de coisa alguma;
       Relaxe e se assente no continuum da pureza indestrutível
       E, com as amarras soltas, a liberação é certa.

       [3] Olhando concentradamente para o céu vazio, a visão cessa;
       Do mesmo modo, quando a mente olha para a própria mente,
       Termina o treinamento do pensamento discursivo e conceitual
       E a iluminação completa é obtida.

       [4] Assim como a neblina da manhã se dissolve no ar,
       Indo a lugar nenhum mas cessando de ser,
       As ondas da conceitualização — tudo criação da mente — se dissolvem
       Quando você observa a verdadeira natureza de sua mente.

       [5] O espaço puro não tem cor ou forma
       E não pode ser manchado de preto ou branco;
       Assim também, a essência da mente está além da cor e da forma
       E não pode ser manchada por ações negras ou brancas.

       [6] A escuridão de mil eras não tem poder
       Para ofuscar a claridade de cristal do coração do sol;
       E do mesmo modo, eras de samsara não têm poder
       Para encobrir a luz clara da essência da mente.

       [7] Apesar do espaço ser designado de vazio,
       Na realidade ele é inexprimível;
       Apesar da natureza da mente ser chamada de luz clara,
       Sua própria atribuição é uma ficção verbal sem base.

       [8] A natureza original da mente é como o espaço;
       Ela permeia e abraça todas as coisas sob o sol.
       Seja calmo e permaneça relaxado no conforto genuíno,
       Seja quieto e deixe o som reverberar como um eco,
       Mantenha silenciosa a sua mente e assista o fim de todos os mundos.

       [9] O corpo é essencialmente vazio, como um tronco de junco,
       E a mente, como o espaço puro, transcende absolutamente o mundo do pensamento;
       Relaxe em sua natureza intrínseca, sem abandono ou controle —
       A mente sem objetivo é o Mahamudra —
       E, com a prática perfeita, a iluminação suprema é obtida.

       [10] A luz clara do Mahamudra não pode ser revelada
       Pelas escrituras canônicas e tratados metafísicos
       Do Mantravada, das Paramitas ou do Tripitaka;
       A luz clara é encoberta pelos conceitos e idéias.

       [11] Nutrindo preceitos rígidos, o verdadeiro samaya é enfraquecido,
       Mas com a cessação das atividades mentais, todas as noções fixas se apaziguam;
       Quando a maré do oceano é una com suas profundezas pacíficas,
       Quando a mente nunca se desvia da verdade indeterminada e não-conceitual,
       O samaya inquebrável é como uma lâmpada acesa na escuridão espiritual.

       [12] Livre dos conceitos intelectuais, desaprovando os princípios dogmáticos,
       A verdade de cada escola e escritura é revelada.

       [13] Absorvido no Mahamudra, você está livre da prisão do samsara;
       Equilibrado no Mahamudra, a culpa e a negatividade são consumidas;
       E como um mestre do Mahamudra, você é a luz do Dharma.

       [14] O tolo em sua ignorância, desprezando o Mahamudra,
       Nada conhece além da luta na inundação do samsara.
       Tenha compaixão por aqueles que sofrem de constante ansiedade!
       Doente de um sofrimento inflexível e desejando a liberação, adira a um mestre,
       Pois quando a bênção dele tocar o seu coração, a mente é liberada.

       [15] Kyeho! Ouça com alegria!
       O investimento no samsara é fútil; é a causa de cada ansiedade.
       Já que o envolvimento mundano é inútil, procure o coração da realidade.

       [16] Na transcendência das dualidades da mente, está a visão suprema;
       Em uma mente calma e silenciosa, está a meditação suprema;
       Na espontaneidade, está a atividade suprema;
       E quando todas as esperanças e medos falecem, a meta é alcançada.

       [17] Além de todas as imagens mentais, a mente é naturalmente clara:
       Não siga outro caminho que não seja o dos buddhas,
       Não aplique técnica alguma para obter a iluminação suprema.

       [18] Kyema! Ouça com simpatia!
       Com a sabedoria em seu lamentável predicamento mundano,
       Percebendo que nada pode durar, que tudo é como um sonho,
       Como uma ilusão sem significado, que provoca frustração e aborrecimento,
       Retorne e abandone suas buscas mundanas.

       [19] Corte o envolvimento com sua terra natal e seus amigos
       E medite sozinho em um retiro na floresta ou na montanha;
       Fique lá em um estado de não-meditação
       E, atingindo o não-atingimento, você atinge o Mahamudra.

       [20] Uma árvore estende seus galhos e põe folhas,
       Mas quando sua raiz é cortada, sua folhagem seca.
       Assim também, quando a raiz da mente é cortada,
       Os galhos da árvore do samsara morrem.

       [21] Uma única lâmpada elimina a escuridão de mil eras;
       Do mesmo modo, um único lampejo da luz clara da mente
       Apaga eras de condicionamento kármico e cegueira mental.

       [22] Kyeho! Ouça com alegria!
       A verdade além da mente não pode ser compreendida por qualquer faculdade mental;
       O significado da não-ação não pode ser compreendido pela atividade compulsiva;
       Perceber o significado da não-ação e do além-mente
       Corta a mente em sua raiz e repousa na consciência nua.

       [23] Permita que as águas barrentas da atividade mental se clareiem;
       Refreie tanto a projeção positiva quanto a negativa —
       Deixe as aparências sozinhas.
       O mundo dos fenômenos, sem adição ou subtração, é o Mahamudra.

       [24] A onipresente base não-nascida dissolve seus impulsos e delusões;
       Não seja convencido ou calculista, mas repouse na essência não-nascida
       E deixe se dissolver todos os conceitos de si mesmo e do universo.

       [25] A mais elevada visão abre cada porta;
       A mais elevada meditação sonda as profundezas infinitas;
       A mais elevada atividade é não-governada, porém decisiva;
       E a mais elevada meta é o ser comum, sem esperança ou medo.

       [26] No começo, seu karma é como um rio caindo em um desfiladeiro;
       No meio, ele flui como um rio Ganges serpenteando gentilmente;
       E no fim, assim como um rio se torna um com o oceano,
       Ele termina na consumação, como o encontro de mãe e filho.

       [27] Se a mente for estúpida e você for incapaz de praticar estas instruções,
       De reter a respiração essencial e expelir a seiva da consciência,
       De praticar olhares fixos — métodos de focalizar a mente —,
       Discipline-se até que o estado de consciência mental se estabeleça.

       [28] Quando servir a uma consorte, a consciência pura do êxtase e da vacuidade surgirá.
       Disposto na abençoada união da sabedoria e dos meios hábeis,
       Envie a bodhichitta vagarosamente baixo, retenha-a, retraia-a para cima
       E, conduzindo-a à fonte, sature o corpo inteiro.
       Mas essa consciência surgirá apenas se o desejo e o apego estiverem ausentes.
       Então, obtendo a jovialidade da vida longa e eterna, crescente como a lua,
       Radiante e clara, com a força de um leão,
       Você obterá rapidamente o poder mundano e a iluminação suprema.

       Possa esta instrução essencial do Mahamudra
       Permanecer nos corações dos seres afortunados.

 
 
A Instrução Mahamudra para Naropa em Vinte e Oito Versos foi transmitida pelo grande mestre e mahasiddha Tilopa ao pandita, sábio e siddha de Kashmir, Naropa, próximo aos bancos do rio Ganges, após completar suas doze austeridades. Naropa transmitiu os ensinamentos em sânscrito, na forma de vinte e oito versos, ao grande tradutor Marpa Chökyi Lodrö, que fez uma tradução livre deste texto em sua vila, Pulahari, na fronteira do Tibet com o Butão.

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